Fonte:Google. |
Somos livres?
Hoje, teve mais um debate na aula de Sociologia/Filosofia.
Um garoto, citou meu nome e meu exemplo na aula, falando que no Brasil todos são livres e que são livres ATÉ DEMAIS.
Eu e minhas colegas rimos nessa parte, ok, eu devia ter ficado na minha, mas enfim, continuando…
Ele falou “Por exemplo, professor, Anne é transexual, e eu não tenho nada contra”, nesse momento eu parei, me virei e falei “Eu também não tenho nada contra ti”, ele continuou “e o garoto que fez aquilo com ela (ele está se referindo ao meu post “Humilhação no Colégio” que fiz no blog) e ele saiu do colégio porque não podia expressar sua opinião”.
Na mesma hora, eu e outras colegas minhas, corrigiram ele dizendo que:
1- Ele saiu porque quis.
2- Ele saiu por razões pessoais que foram citadas na sala e eu obviamente não vou citar.
Logo depois disso, a aula acabou ele veio falar comigo, e me pediu desculpas dizendo que não queria me ofender, daí eu perguntei o porquê dele estar pedindo desculpas, e ele falou “É porque para mim, todos no Brasil são livres”, quando ele falou isso, as lágrimas já começaram a descer e eu o interrompi e falei “Não, eu não sou livre, eu não posso andar na rua, “sendo livre””. Então ele falou “Eu acho que tu pode andar na rua sim”, já chorando, falei “Não, eu não sou livre na rua quando me xingam de traveco, eu não sou livre na rua quando me perseguem para me bater pelo único fato de eu ser eu, trans”.
Na mesma hora, minhas colegas, falaram “Calma, Anne, ele tá falando do governo que nos deixa livre, mas a sociedade nos prende”.
Eu respondi: “ O governo não me deixa livre quando para eu entrar em um colégio preciso PRIMEIRO implorar ao colégio para aceitarem uma aluna trans, SEGUNDO pedir para usarem meu nome social, TERCEIRO pedir para usar o banheiro com qual eu me IDENTIFICO, e além disso, PARA EU TER O MEU NOME E GÊNERO CORRETOS, eu preciso abrir um processo que tem que ter laudo de PSIQUIATRA, PSICÓLOGO, ENDOCRINOLOGISTA E ATÉ TESTEMUNHAS PARA “PROVAREM” QUE EU SOU MULHER”.
Logo depois disso, saí da sala chorando, porque não tive forças para aguentar isso tudo, eu entendo que muito disso foi ignorância, ninguém é obrigado a saber o que eu e meus/minhas irmãs trans sofremos diariamente, mas, eu ainda sou imatura, ainda sou frágil. Era para eu ter ficado na sala e ter resistido, ter continuado a falar e a explicar, mas preferi sair, porque não aguentei ficar naquele ambiente.
Tanto o governo quanto a sociedade reprime toda a nação trans, em todos os aspectos somos minorias, somos minorias por sermos trans, somos minorias dentro da própria causa LGBT que sempre deixam nossos direitos por último, e somos minoria na educação, que ao invés de nos incentivar a ficar no colégio, nos expulsam e nos põe no único local em que somos aceitas, na rua, de noite, nos prostituindo.
Eu não posso ficar parada enquanto amigas minhas trans de 15 anos não são aceitas pela família e para poderem arcar com roupas femininas, hormônios, e etc tem que se prostituir, perdendo então sua inocência, e sua adolescência que mal começou, e além disso são maltratadas no colégio não podendo usar o banheiro com qual se identificam e o seu nome social.
Eu não posso e nem vou ficar parada enquanto diariamente adolescentes trans se matam por não poderem viver como querem, ou por não serem aceitos pela família, ou por sofrerem bullying no colégio, ou por sofrerem ataques consistentes na rua.
Estão cansados dos meus textos? Que pena, não vou parar, essa é minha luta, e eu vou resistir, amanhã vou ao colégio, porque não estou lá para agradar todo mundo e sim para estudar e poder ter uma vida que muitas trans não podem.
Não sou a pessoa mais madura do mundo, nem a mais inteligente, mas da minha luta eu sei, e sei muito bem.
Pois sou eu quem luto por ela TODO DIA.
- 11:18
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